Wednesday, September 14, 2016

Reviravolta – 4

Na busca de uma ideia pra esse trabalho a ser apresentado no Congresso, fui conversar com vários professores. Um deles era um americano que lecionava na Universidade, chamado Wayne Thomas Enders, que acabou sendo meu orientador da monografia pois Miguel precisou se ausentar do Brasil pra fazer seu estágio pós-doutoral.

Fui encontrar com ele, que como todo americano, era objetivo e me sugeriu um tema de trabalho interessantíssimo, baseado em uma ideia de um amigo dele chamado Peter Dakowski. A ideia existia, eu teria que me aprofundar e estruturar aquilo como trabalho acadêmico. Fui atrás, fiz os levantamentos que precisava, embora o referencial teórico era de difícil equalização.

A ideia consistia no seguinte. Como Natal era o ponto mais próximo da Europa e mais próxima dos Estados Unidos do que os portos do sudeste brasileiro, Natal seria o pólo receptador dos carros importados. A ideia era aproveitar as carretas de carros que sairiam de Natal com os carros importados para abastecer o sudeste e usar essas mesmas carretas para trazer para o nordeste os carros fabricados no sudeste. Na época, as carretas que vinham com os carros fabricados no nordeste voltavam pra São Paulo vazias, onerando bastante o custo desse transporte.

Evidentemente, sabíamos da dificuldade política disso acontecer, mas para um trabalho acadêmico, me pareceu perfeito, até porque tinha muitos aspectos práticos e não somente os devaneios teóricos que tanto me davam náusea.

A data do congresso chegou e eu não tinha nada organizado ainda teoricamente, tudo que tinha era a ideia em uma folha de papel. Tudo bem, pois teria apenas que apresentar o trabalho oralmente. A apresentação tinha que ser simples, para uma banca de professores e alunos na plateia. Acredito que não gastei nem 15 minutos explicando a ideia, em compensação, passei uns 45 minutos respondendo perguntas. Uma pergunta gerava outra e por sorte, todas as perguntas que foram feitas, eu tinha as respostas.

Saí de lá arrasado. Fui massacrado, pensei. Fui pra cantina e descansei, após um fuzilamento de tantas perguntas. Bem, vida que seguiu. Passaram-se algumas semanas, e continuei indo pra base de pesquisas de Miguel todos os dias. Um belo dia, chega Miguel com aquele sorriso dele, segurando um negócio em um das mãos, com o sotaque boliviano dele, dizendo: “Ganhamos, rapaz, ganhamos!!!”.

Eu, genuinamente, não tinha a menor ideia sobre o que ele estava falando e perguntei, “ganhamos o que, homem de Deus?”. Ele finalmente explicou, após alguns momentos de suspense. Havia sido o prêmio de melhor apresentação oral do congresso na minha categoria, que eu havia ganho, o que me dava um troféu, que ele segurava em sua mão, balançando, feliz, e uma passagem para ir pra Brasília, defender o trabalho completo.

Minha primeira pergunta foi: “Ninguém nunca ganhou esse troféu aqui na sua base, hein? Pois agora saiba que tem um troféu aqui, carajo!!!”. Acredito que esse prêmio foi o que faltava pra cimentar de vez minha ida pro mestrado. Eu mostrei ali, mesmo sem saber, que estava mesmo disposto a seguir aquele caminho. Penso que ganhei o respeito de Miguel de vez naquele momento.

O ano era 1999 e nesse ano, como prova total do meu foco, decidi não participar do carnaval fora de época da minha cidade. Havia participado de todos, desde sua criação. E nunca mais participei de nenhum depois disso. Aí sim, meu pai acreditou que eu realmente estava falando sério.

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