Chegamos em Newark
completamente embriagados. Eu estava de fato tonto. Como não
tínhamos o visto americano, um guarda veio nos buscar dentro da
aeronave pra que ficássemos presos numa salinha, esperando até a
hora da conexão sair pra Montreal. Naquela época esse procedimento
era permitido. E o guarda chegou e a gente só fazia rir. O cara
ficou puto e foi nos levando sem dar uma palavra. Ficamos nessa sala
por pouco tempo e depois mandaram uma jovem senhora nos levar pro
avião.
Zumel ainda embriagado,
começou a fazer comentários jocosos com relação a menina. Bêbado,
ele nem percebia o tamanho das besteiras que dizía. Ela andava na
nossa frente e de vez em quando olhava pra trás e sorria. E isso
continuou enquanto
atravessávamos o gigantesco aeroporto de Newark. Quando
chegou no portão de embarque, ela nos entregou ao oficial da
companhia e ao se despedir, disse, em bom português de Portugal:
“Muito prazer,
meu nome é Teresa. Tenham uma boa viagem”. Foi
o primeiro mico continental que passamos. Muitos outros ainda viriam.
Fizemos um vôo tranquilo
e chegamos em Montréal na hora marcada. Depois de passarmos pela
alfândega e imigração, paramos no saguão do aeroporto, perto da
saída. A porta se abriu e entrou aquele vento frio do rigoroso
inverno canadense. Foi quando demos conta da merda em que estávamos
metidos. Não tínhamos pra onde ir. Nem a menor ideia. Foi quando me
lembrei que tinha anotado o telefone do professor Allan Jolly, amigo
de Miguel Anez, aquele que havia feito seu curso de doutorado na
Fundação Getulio Vargas e que falava um pouco de português.
Dei a tarefa pra Zumel
ligar pra ele, na ilusão de que Jolly iria nos pegar no aeroporto e
nos levar pra sua casa. No chance. Ele disse estar longe pois
era noite de reveillon e que não iria poder nos ajudar naquele
momento e recomendou um hotel barato, situado na rua Côte-des-neiges,
chamado Hotel Terrace Royale. Saímos do aeroporto e deleguei a Zumel
também a tarefa de falar com o taxista e dar o endereço do tal
hotel. O mesmo nos levou pra lá, debaixo de uma nevasca
impressionante.
A primeira imagem que
tive de Montréal e que fica na minha memória até hoje foi a
imponência do oratório St-Joseph. Ele estava todo iluminado naquela
hora. Que coisa linda. Chegamos no hotel e também com uma fome
monstruosa, repetimos a experiencia da pizza delivery. Montreal
funcionava do mesmo jeito de São Paulo e somente as pizzarias
próximas faziam as entregas. O problema era que não sabíamos onde
estávamos, quem dirá saber se a pizzaria estava perto ou não. Pelo
menos foi o que o fresco do Zumel me disse, pois como eu não falava
porra nenhuma, confiava no “porra nenhuma dele mais 0,5”.
Dormimos com fome novamente.
Ah, esqueci de dizer. A
diária do hotel “barato” de Allan Jolly custava 120
dólares canadenses. Ao descobrir isso, o plano era ficar um, no
máximo dois dias por ali. Vimos a entrada do ano 2000 pela televisão
e algumas pessoas festejando na rua pela janela do hotel. Zumel
dormiu primeiro e eu fiquei sentado, olhando a janela em silencio.
Era a passagem de ano mais solitaria da minha vida. Mas ao mesmo
tempo estava maravilhado e aliviado pois tínhamos chegado em algum
lugar, porém com o cu na mão pois sabia que tínhamos que nos mudar
dali. E rápido.
Acordei logo cedo, com o
estômago colado na coluna vertebral e saímos em busca de comida.
Paramos logo num Nickel’s, que tinha na esquina e morremos de cara
em 30 dólares. Pensei: estamos fudidos! Desse jeito, o numerário
que tenho vai acabar em poucos dias e a ultima coisa que quero, é
ter que pedir dinheiro emprestado a esse galado desse Zumel.