Wednesday, October 5, 2016

Paulicéia desvairada – 7

Foi o desgraçado fechar a boca e eu agarrei nas minhas duas malas e atravessei a rua correndo, pra outra calçada, onde tinha um táxi parado. Todos os meus pertences estavam ali e eu segurando com tanta força aquela mala, só me lembrando do velho agarrado ao assento do avião. Arrumamos as malas como deu e saímos dali voando, tentando responder ao motorista que não éramos doidos por estar naquele local com quatro malas, dando sopa. Pagamos a fortuna do taxista, que por sinal não estava no orçamento de Jajá, e entramos no hotel já com o prejuízo absorvido.

Dormimos bem e no dia seguinte, saímos em disparada pro Consulado Canadense, que na época se situava na Avenida Paulista, pouco depois do MASP. Mas como chegar naquela porra? Lá se foi o falecimento de mais algumas notas de Real pra um novo taxista. Fui na frente e ao dizer qual era a nossa missão, o taxista entregou uma foto com um santo e uma prece atrás pra ser lida toda as vezes em que estivéssemos em dificuldades. Era o Santo Expedito, que sempre ajudava-o nas causas mais difíceis.

Agradeci ao motorista mas fiquei encucado. Se aquele galado daquele taxista estava achando uma causa difícil nós obtermos o visto canadense, o que diria o outro corno que iria carimbar o passaporte? Se o motorista era um brasileiro como nós, um nordestino honrado (?), estava pondo em prova o final feliz dessa história, o canadense então iria nos trucidar. Não passei essa preocupação pra Zumel, que como um abestalhado estava perguntando o nome dos lugares por onde passávamos ao taxista. Eu queria lá saber nome de porra nenhuma. Minha preocupação era poder embarcar.

Marcamos de encontrar com o despachante, que trabalhava pra STB, a agência por onde estávamos viajando, com passagem com preço de estudante, do nosso amigo Maninho (700 dólares na época). Chegamos no Consulado Canadense, a praga ainda estava fechada, talvez chegamos antes, não sei. Ficamos perambulando pra cima e pra baixo na Avenida Paulista e em alguma galerias pra passar o tempo. Gastar alguma coisa, nem pensar. Então encontramos o sujeito, um negão de quase dois metros de altura. Sorridente e confiante. O Consulado abriu e tínhamos que bater foto pra poder adentrar naquele palácio. Nunca tinha visto um negócio daqueles. E o crachá já saia na hora.

Entramos esmagados pela moral dos canadenses. Mandaram que a gente sentasse num lugar que apontaram e ficamos ali esperando. E eu não via o negão conhecer ninguém ali. Daqui a pouco chamam o nome da gente. O negão faz sinal pra que esperássemos. “Porra é essa, Zumel?”, eu quis saber. A gente sai lá de Natal pra cá, pra na hora que chamam a gente, esse cara vai lá e nem vão escutar o que a gente tem pra dizer? Daqui a pouco caminha o negão, com os passaportes na mão e os vistos concedidos. Todo risonho.

Eu só pensava nas diárias do hotel que tivemos que pagar. Tudo em vão, pois o negão nem precisou da gente. Pensava no que iria dizer pro meu pai. Que eu iria ter que inventar uma entrevista fictícia e interrogatória, que eu só me dei bem por causa da minha retórica refinada. Foi quando, no meio dos meu devaneios, escutei um grito: “Bora, galado, quer que eles mudem de idéia, é?

Era Zumel com medo. Fomos embora e falei pra ele: “Sabe de uma? Vamos tomar uma pra comemorar essa porra. Nem quero saber quanto vamos gastar. Afinal, o que é um peido pra quem está já todo cagado?” Lá se foi outro táxi. Agora com visto canadense, eu já me sentia rico. Associação mais estúpida não poderia existir, mas assim foi. Porém, não se sentindo tão rico assim, pois o visto era canadense e não americano, mandamos o motorista tocar pro hotel, uma vez que acharíamos um bar ali perto pra não ter que morrer em outro táxi quando acabasse a bebedeira.

No comments:

Post a Comment